Sunday, March 08, 2015

Brasil Pandeiro




Eu odeio Carnaval.

Pronto, falei.

Nem sempre foi assim. Quando eu era moleque tinha esse sonho de um dia conseguir assistir ao desfile das escolas de samba do Rio inteiro. Apesar da extraordinária permissão que meus pais davam para passar a noite em claro, o cansaço e o tédio sempre triunfavam. Era uma overdose de cores, plumas, paetês (tenho que confessar que dei uma procurada no Google para lembrar o que é) e  as misturas bizarras dos temas de samba enredo - aquela mistura de fatos históricos obscuros, referências do candomblé e cultura popular que só devem fazer sentido para quem assiste ao desfile tomando ácido.

O tempo passou e depois de várias tentativas frustradas que terminaram prematuramente nos braços de Orfeu e Morfeu, a versão pré-adolescente de mim perdeu o interesse na Sapucaí e em tudo mais que se relaciona com a indústria do carnaval, com a exceção das fotos das celebridades de biquíni nas páginas das finadas revistas Manchete, Amiga TV Tudo e Fatos & Fotos e as zarpadas secretas depois da meia-noite pelos canais de TV que faziam a cobertura dos bailes nos clubes, com repórteres que não sabem o que perguntar entrevistando modelos-atrizes que não sabem o que responder - tendo a bacanália como pano de fundo.

Mas como acontece com uma boa parte da sociedade, para mim com o tempo o Carnaval virou um feriado prolongado para se desconectar de tudo - especialmente do Carnaval.

Ir para um lugar longe e isolado, colocar a leitura em dia, fazer caminhadas, assistir a todos os filmes que perdeu e prometeu assistir e por aí vai. Vale tudo - desde que não seja Carnaval.

Mas é quase impossível se esconder. Oficialmente ele acontece no final de Fevereiro ou começo de Março e dura 5 dias, dependendo da vontade dos astros - ou da Lua - mas na verdade ele começa logo depois do Ano Novo e só acaba na primeira Segunda-Feira depois da Quarta-Feira de Cinzas. São dois meses ou dois meses e meio em que nada de importante acontece no Brasil. Todas as decisões importantes, contratações, compras, qualquer coisa que tenha alguma importância para as nossa vida pessoal e corporativa tem que esperar o fim do Carnaval. Este bendito evento marca o começo não-oficial do ano - dois meses depois.

E eu odeio isso.

O Carnaval nos faz uma nação de procrastinadores. Jogamos fora 2 meses do ano para um evento em que nem sabemos bem o que está sendo celebrado (eu nem vou falar das origens pagãs das festividades para não deixar todo mundo confuso).

Mas é claro que arrumamos razão para a festa. Se a vida está boa, a razão é celebrar. Se a vida está ruim, a razão é compensar. Se está mais ou menos, vamos aproveitar porque nunca se sabe o dia de amanhã. Se a gente não sabe exatamente como estão as coisas, celebramos - só por via das dúvidas.

E assim caminha a humanidade.

Agora, depois de 10 anos fora do Brasil, eu tenho a oportunidade de olhar com um pouco mais de distância.

O Carnaval faz mal para o Brasil porque é a cara do Brasil. Cada que vez que uma imagem de um cara girando o pandeiro do lado de uma passista bunduda aparece na mídia internacional imagino os analistas do Standard & Poor's dando um downgrade na nossa avaliação e aumentando o risco Brasil.

Claro que o governo brasileiro tem trabalhado duro para fazer  nossa imagem ficar ainda pior no exterior (parece que eles têm um talento para isso). No momento as coisas que nos definem como nação para os estrangeiros são uma corrupção épica, monumental, nosso maravilhoso futebol (sim, estou sendo sarcástico) e uma festa hiperbólica ultra-sexualizada que pára um país de 200 (duzentos) milhões de habitantes.

Ouch! (Interjeição da língua inglesa que demonstra sofrimento físico ou psicológico)

E não estou falando mal do Carnaval e suas implicações porque acho que o brasileiro trabalha pouco e não merece comemorar. Na verdade trabalha muito, mas para si mesmo. Fazer um país melhor dá trabalho e nem sempre é claro como nos beneficiamos quando fazemos coisas para o bem-comum. Por isso trabalhar por um Brasil melhor é uma coisa que deixamos para amanhã, quando não estivermos tão ocupados. Dá a sensação de que se pudéssemos a gente terceirizaria essa tarefa.

Será que não dá para contratar uma empresa japonesa ou coreana para isso?

Aí vai dar para curtir o Carnaval mais sossegado...

P.S.: Estava muito reclamão neste post. Aqui vai uma imagem de gatinho para compensar.